DIÁRIO DE MINA HARKER
30 de setembro — Duas horas depois do jantar, estávamos reunidos no gabinete do Dr. Seward. O professor Van Helsing ficou na cabeceira e eu à sua direita, fazendo as funções de secretária; Jonathan sentou-se perto de mim. Em frente estavam Lord Godalming, o Dr. Seward e o Sr. Morris.
— Creio — começou o professor — que devo dizer algumas palavras sobre o inimigo que temos de enfrentar. Os vampiros existem. Não podemos duvidar disso. Mas, se fomos incapazes de salvar a desventurada Miss Lucy, temos o dever de trabalhar para que outras almas não pereçam, quando as podemos salvar. O nosferatu não morre como a abelha quando se pica. Fica mais forte e mais capaz de praticar o mal. Esse vampiro que está entre nós é mais forte que vinte homens; é mais astucioso que qualquer mortal e se vale, ainda, da necromancia; pode, dentro de certas limitações, aparecer à vontade, sob qualquer das formas de que dispõe; pode, dentro de sua categoria, dirigir os elementos: a tempestade, o nevoeiro, o raio; pode dar ordem a seres inferiores: o rato, o morcego, a coruja, a raposa e o lobo; pode crescer e tornar-se pequeno; e pode, às vezes, desaparecer e tornar-se desconhecido. Não será fácil destruí-lo. Mas temos um dever diante de nós e não podemos recuar. Quanto a mim, estou velho, e pouco tenho a perder. Mas vocês são moços. Que me dizem?
Quando o professor terminou eu e meu marido encaramo-nos bem nos olhos, e ele exclamou: — Respondo por mim e por Mina.
— Conte comigo, professor — disse Quincey Morris, laconicamente.
— Estou com o senhor — disse Lord Godalming. — Por causa de Lucy, se não houvesse outro motivo.
O Dr. Seward limitou-se a um aceno de cabeça.
— Muito bem — prosseguiu o Dr. Van Helsing. — Já sabem contra o que temos de lutar; mas não carecemos, também, de poderio. Temos a ciência, temos liberdade de agir e raciocinar e podemos dispor tanto das horas do dia quanto da noite. Lutamos por uma causa, anos pela abnegação e não pelo egoísmo. Tudo isso tem grande importância. Vejamos as limitações dos vampiros em geral e, em particular, daquele contra o qual temos que lutar. O.vampiro não morre com a passagem do tempo simplesmente; fortalece-se, quando pode dispor do sangue dos vivos. E mais do que isso, vemos que pode mesmo rejuvenescer. Mas não pode se fortalecer sem a dieta de sangue; não come outra coisa. O amigo Jonathan que morou com ele durante semanas, jamais o viu comer. Não produz sombra, nem se reflete no espelho, como Jonathan também teve ocasião de constatar. Tem uma força prodigiosa, outra constatação de Jonathan. Pode se transformar em lobo, como deduzimos pela chegada do navio a Whitby, onde ele despedaçou um cão; pode se transformar em morcego, como Madame Mina viu na janela em Whitby e como foi visto na janela do quarto de Lucy. Pode surgir no meio do nevoeiro, como mostrou o capitão do navio, as parece que esse nevoeiro é limitado e só fica em torno dele próprio. Pode vir sob a forma de poeira, como Jonathan viu se dar com as irmãs no castelo de Drácula. Pode se tornar pequeníssimo, como nós próprios vimos, quando Miss Lucy entrou numa fenda diminuta para o túmulo. Pode ver no escuro, o que é uma grande coisa. Pode fazer tudo isso, mas não é livre. Está mais preso que o escravo na galé ou o louco na cela. Não pode ir aonde quer. Não pode entrar em lugar algum pela primeira vez, a não ser que alguém da casa o convide, embora, depois, possa entrar à vontade. Seu poder, como o de todas as coisas malignas, cessa com o nascer do dia. Apenas em certas ocasiões tem uma liberdade ilimitada. Se não está no lugar ao qual pertence, só pode se mudar ao meio-dia ou no momento exato do nascer e do pôr do sol. Assim, ao passo que pode fazer o que quer dentro de seus limites, quando mora em seu túmulo, sua casa infernal, seu lugar sacrílego, como vimos na cova do suicida em Whitby; em outras ocasiões, só pode se mudar na oportunidade propícia. Existem coisas que o afligem tanto que não tem poder contra elas, como o alho, que nós conhecemos, e entre as coisas sagradas, como símbolo, meu crucifixo. Há ainda outras coisas: um ramo de rosa-silvestre colocado no seu caixão o impede de sair de lá; uma bala abençoada disparada contra seu caixão mata-o de verdade, e, quanto à estaca, vocês já conhecem seu poder, assim como a cabeça cortada. Vimos isto com nossos próprios olhos. Assim, precisamos descobrir a habitação desse ex-homem, prendê-lo em seu caixão e destruí-lo.
O Sr. Morris, que estava olhando atentamente para a janela, saiu nesse momento do aposento. Houve uma pequena pausa, e o professor prosseguiu: — E, agora, vamos traçar os planos de nossa campanha. Sabemos que do castelo vieram para Whitby cinqüenta caixas de terra, todas as quais foram entregues em Carfax; também sabemos que pelo menos algumas dessas caixas foram removidas. Parece-me, que a primeira coisa que devemos fazer e verificar se o resto das caixas está na casa vizinha deste hospício.
Um tiro de pistola, disparado do lado de fora, o interrompeu; a vidraça da janela foi quebrada por uma bala, que, ricocheteando, foi se cravar no alto da parede do gabinete. Todos os homens se puseram de pé. Lord Godalming correu até a janela e abriu-a. Ouvimos, então, a voz do Sr. Morris, vinda do lado de fora: — Desculpem-me por té-los assustado.
Um minuto mais tarde, tendo voltado, ele nos explicava: — Foi uma tolice minha, e peço-lhe mil desculpas, Sra. Harker. Receio tê-la assustado muito. Mas é que, enquanto o professor estava falando, apareceu um grande morcego... que pousou no peitoril da janela. Por causal destas coisas que têm acontecido, tomei tanto horror desses bichos, que não pude me conter e sàí, pga atirar nele, como faço, agora, sempre que vejo um morcego.
— Acertou? — perguntou o Dr. Van Helsing.
— Não sei; acho que não, pois ele fugiu para o bosque. — Tornamos a nos sentar e o professor prosseguiu: — Precisamos descobrir aquelas caixas ou capturar ou matar aquele monstro em seu esconderijo; ou, então, por assim dizer, esterilizar a terra, de maneira que ele não possa mais procurar proteção nela. Assim, poderíamos encontrá-lo em sua forma de homem, entre o meio-dia e o pôr do sol, quando ele é mais fraco. Quanto à senhora, Madame Mina, de agora em diante deve se poupar. Quando nos separarmos hoje, a senhora não deve mais fazer perguntas. Oportunamente, nós lhe diremos tudo. A senhora é nossa estrela e nossa esperança e queremos agir sabendo que não corre os mesmos perigos que nós.
Nada pude fazer, a não ser concordar.
— Como não há tempo a perder, proponho irmos imediatamente ver a casa dele — exclamou Morrís. — Para combate-lo, o fator tempo é da máxima importância.
A proposta foi aceita e todos saíram. Vou deitar-me e fingir que estou dormindo, para que Jonathan não fique ainda mais aflito quando voltar.
— Creio — começou o professor — que devo dizer algumas palavras sobre o inimigo que temos de enfrentar. Os vampiros existem. Não podemos duvidar disso. Mas, se fomos incapazes de salvar a desventurada Miss Lucy, temos o dever de trabalhar para que outras almas não pereçam, quando as podemos salvar. O nosferatu não morre como a abelha quando se pica. Fica mais forte e mais capaz de praticar o mal. Esse vampiro que está entre nós é mais forte que vinte homens; é mais astucioso que qualquer mortal e se vale, ainda, da necromancia; pode, dentro de certas limitações, aparecer à vontade, sob qualquer das formas de que dispõe; pode, dentro de sua categoria, dirigir os elementos: a tempestade, o nevoeiro, o raio; pode dar ordem a seres inferiores: o rato, o morcego, a coruja, a raposa e o lobo; pode crescer e tornar-se pequeno; e pode, às vezes, desaparecer e tornar-se desconhecido. Não será fácil destruí-lo. Mas temos um dever diante de nós e não podemos recuar. Quanto a mim, estou velho, e pouco tenho a perder. Mas vocês são moços. Que me dizem?
Quando o professor terminou eu e meu marido encaramo-nos bem nos olhos, e ele exclamou: — Respondo por mim e por Mina.
— Conte comigo, professor — disse Quincey Morris, laconicamente.
— Estou com o senhor — disse Lord Godalming. — Por causa de Lucy, se não houvesse outro motivo.
O Dr. Seward limitou-se a um aceno de cabeça.
— Muito bem — prosseguiu o Dr. Van Helsing. — Já sabem contra o que temos de lutar; mas não carecemos, também, de poderio. Temos a ciência, temos liberdade de agir e raciocinar e podemos dispor tanto das horas do dia quanto da noite. Lutamos por uma causa, anos pela abnegação e não pelo egoísmo. Tudo isso tem grande importância. Vejamos as limitações dos vampiros em geral e, em particular, daquele contra o qual temos que lutar. O.vampiro não morre com a passagem do tempo simplesmente; fortalece-se, quando pode dispor do sangue dos vivos. E mais do que isso, vemos que pode mesmo rejuvenescer. Mas não pode se fortalecer sem a dieta de sangue; não come outra coisa. O amigo Jonathan que morou com ele durante semanas, jamais o viu comer. Não produz sombra, nem se reflete no espelho, como Jonathan também teve ocasião de constatar. Tem uma força prodigiosa, outra constatação de Jonathan. Pode se transformar em lobo, como deduzimos pela chegada do navio a Whitby, onde ele despedaçou um cão; pode se transformar em morcego, como Madame Mina viu na janela em Whitby e como foi visto na janela do quarto de Lucy. Pode surgir no meio do nevoeiro, como mostrou o capitão do navio, as parece que esse nevoeiro é limitado e só fica em torno dele próprio. Pode vir sob a forma de poeira, como Jonathan viu se dar com as irmãs no castelo de Drácula. Pode se tornar pequeníssimo, como nós próprios vimos, quando Miss Lucy entrou numa fenda diminuta para o túmulo. Pode ver no escuro, o que é uma grande coisa. Pode fazer tudo isso, mas não é livre. Está mais preso que o escravo na galé ou o louco na cela. Não pode ir aonde quer. Não pode entrar em lugar algum pela primeira vez, a não ser que alguém da casa o convide, embora, depois, possa entrar à vontade. Seu poder, como o de todas as coisas malignas, cessa com o nascer do dia. Apenas em certas ocasiões tem uma liberdade ilimitada. Se não está no lugar ao qual pertence, só pode se mudar ao meio-dia ou no momento exato do nascer e do pôr do sol. Assim, ao passo que pode fazer o que quer dentro de seus limites, quando mora em seu túmulo, sua casa infernal, seu lugar sacrílego, como vimos na cova do suicida em Whitby; em outras ocasiões, só pode se mudar na oportunidade propícia. Existem coisas que o afligem tanto que não tem poder contra elas, como o alho, que nós conhecemos, e entre as coisas sagradas, como símbolo, meu crucifixo. Há ainda outras coisas: um ramo de rosa-silvestre colocado no seu caixão o impede de sair de lá; uma bala abençoada disparada contra seu caixão mata-o de verdade, e, quanto à estaca, vocês já conhecem seu poder, assim como a cabeça cortada. Vimos isto com nossos próprios olhos. Assim, precisamos descobrir a habitação desse ex-homem, prendê-lo em seu caixão e destruí-lo.
O Sr. Morris, que estava olhando atentamente para a janela, saiu nesse momento do aposento. Houve uma pequena pausa, e o professor prosseguiu: — E, agora, vamos traçar os planos de nossa campanha. Sabemos que do castelo vieram para Whitby cinqüenta caixas de terra, todas as quais foram entregues em Carfax; também sabemos que pelo menos algumas dessas caixas foram removidas. Parece-me, que a primeira coisa que devemos fazer e verificar se o resto das caixas está na casa vizinha deste hospício.
Um tiro de pistola, disparado do lado de fora, o interrompeu; a vidraça da janela foi quebrada por uma bala, que, ricocheteando, foi se cravar no alto da parede do gabinete. Todos os homens se puseram de pé. Lord Godalming correu até a janela e abriu-a. Ouvimos, então, a voz do Sr. Morris, vinda do lado de fora: — Desculpem-me por té-los assustado.
Um minuto mais tarde, tendo voltado, ele nos explicava: — Foi uma tolice minha, e peço-lhe mil desculpas, Sra. Harker. Receio tê-la assustado muito. Mas é que, enquanto o professor estava falando, apareceu um grande morcego... que pousou no peitoril da janela. Por causal destas coisas que têm acontecido, tomei tanto horror desses bichos, que não pude me conter e sàí, pga atirar nele, como faço, agora, sempre que vejo um morcego.
— Acertou? — perguntou o Dr. Van Helsing.
— Não sei; acho que não, pois ele fugiu para o bosque. — Tornamos a nos sentar e o professor prosseguiu: — Precisamos descobrir aquelas caixas ou capturar ou matar aquele monstro em seu esconderijo; ou, então, por assim dizer, esterilizar a terra, de maneira que ele não possa mais procurar proteção nela. Assim, poderíamos encontrá-lo em sua forma de homem, entre o meio-dia e o pôr do sol, quando ele é mais fraco. Quanto à senhora, Madame Mina, de agora em diante deve se poupar. Quando nos separarmos hoje, a senhora não deve mais fazer perguntas. Oportunamente, nós lhe diremos tudo. A senhora é nossa estrela e nossa esperança e queremos agir sabendo que não corre os mesmos perigos que nós.
Nada pude fazer, a não ser concordar.
— Como não há tempo a perder, proponho irmos imediatamente ver a casa dele — exclamou Morrís. — Para combate-lo, o fator tempo é da máxima importância.
A proposta foi aceita e todos saíram. Vou deitar-me e fingir que estou dormindo, para que Jonathan não fique ainda mais aflito quando voltar.
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